O clima era de
muita festa, sobretudo porque teríamos desfile de 7 de setembro. Conseguimos reunir
13 viaturas para o evento, uma equipe tática para ficar em cima de uma das
nossas camionetes e o apoio de várias crianças, filhos de nossos policiais.
Isso deu um ar de seriedade, mas também passou ao público a ideia de que apesar
de policiais, todos temos uma família que se preocupa conosco, que nos ampara
nos momentos difíceis, que se faz presente nas horas de alegria. Foi o primeiro
desfile que eu tive que organizar, mas não foi nada difícil, apenas participei
de todas as reuniões sobre o tema, e enviei por email a todos a programação,
nosso itinerário, e o que mais fosse importante de ser dito. Assim, chegado o
grande momento, todos já sabiam o que fazer e como se portar; só tive o
trabalho de alinhar as viaturas na ordem em que eu queria. Iniciado o desfile,
foi impressionante ver a quantidade de pessoas que acordaram cedo para
acompanhar o evento, o número de crianças abanando e mandando beijo. Ali me
senti querido e respeitado ao mesmo tempo. Não houve protesto contra o governo
ou contra a instituição, portanto, tudo correu bem e como o planejado.
Terminado o desfile, recebi ligação da chefe informando que todos os que estavam
na área de autoridades haviam gostado e teceram muitos elogios a respeito, mas
o que me deu uma alegria maior foi ver que aqueles que participaram do desfile
estavam satisfeitos.
Acabada a
hora da festa, iniciamos os trabalhos policiais, voltamos à velha rotina. Para
comemorar o dia 7 de setembro, nada melhor que 7 prisões em flagrante (um
número fora do comum para o que estávamos vivendo nesse inverno, quando abaixam
os números de prisões).
Primeiro. Um
homem seguidamente ameaçava sua companheira. Ela já havia feito diversos
registros de ocorrências e pedido inclusive por duas vezes as medidas
protetivas que a Lei Maria da Penha lhe assegura e mesmo assim o rapaz
continuava a incomodá-la. Assim, não me restou opção a não ser o recolhimento
para o presídio, sobretudo porque certas pessoas acreditam que são
inatingíveis, que as coisas só acontecem com o vizinho, pensam no descrédito
total das instituições públicas. Isso não pode continuar assim, se um juiz
determinou o afastamento do homem, ele deve ficar afastado e ponto. Discussões
sobre se a medida protetiva foi ou não excessiva deve ser feita através de
advogado.
Segundo. Roubo
na rodoviária. O acusado sentou-se ao lado da vítima, pediu-lhe um cigarro,
como forma de despistar o seu intento. Pouco tempo depois, aplicou uma gravata
e pegou o relógio da vitima e saiu do local, porém o segurança deteve o
assaltante e chamou a Brigada, que o trouxe à DPPA. Aqui contou, podre de bêbado,
que não havia roubado, mas que na verdade conhecia a vítima e que o que houve
foi apenas uma desavença entre eles. Optei pela prisão, deixando a ele a
possibilidade de defesa perante o juiz que cuidará do caso.
Terceiro. Furto
mediante destreza, contra idoso de 83 anos. Aproveitando-se das festividades e
da desatenção da vítima, o larápio enfiou a mão no bolso e retirou o celular da
vítima, saindo caminhando logo depois. Com a descrição do celular e do suspeito,
a BM fez buscas e o encontrou fazendo ligações. Na Delegacia confessou o crime,
contando que praticou o crime por estar desempregado e dizendo que começou essa
vida de crimes após a morte de um filho. Como, apesar de triste sua história,
não há justificativa pelo fato delituoso praticado, ele foi levado à prisão.
Quarto. Tentativa
de furto de som automotivo. O acusado entrou em um carro que havia sido furtado
pela manhã para levar o som e acabou sendo pego pela Brigada Militar. Imaginem
o azar desse sujeito. Vê o carro estacionado em local ermo, ingressa nele sem
saber que o veículo estava no sistema como furtado para levar o som. A BM o
levou como no mínimo receptador, mas como ele já havia retirado o som, foi
plausível a versão de que não teria furtado o veículo, nem sabia a sua origem
criminosa. Assim, respondeu apenas pela tentativa de furto do cd automotivo.
Nossos acusados sabem tanto de direito que ele veio pedindo para eu não
autuá-lo por furto qualificado, mas apenas por furto simples, o que foi feito,
já que não havia provas de que ele teria furtado o veículo no início do dia.
Quinto. Roubo
de bicicleta com uso de faca de cozinha. O autuado foi avistado pouco tempo
depois com a bicicleta e o boné da vítima, acompanhado de um menor. A vítima compareceu
à Delegacia e afirmou que apenas o maior teria praticado o roubo, então apenas colocamos
o menor como testemunha do fato e mandamos à prisão somente o adulto, que já possuía
outros crimes em sua história.
Sexto. Sequestro
relâmpago. Esse caso trouxe bastante repercussão, ainda mais porque não é um
modo de operação comum na cidade. Na verdade não foi um sequestro premeditado, uma
moto se aproximou da vítima e o carona desceu para roubá-los, exigiu o dinheiro
ao motorista (pai), mas como a vítima não tinha nada no momento, sugeriu ao
ladrão que o acompanhasse até um banco para que sacasse a quantia pretendida.
Assim, o que era para ser um roubo simples, tornou-se o sequetro relâmpago. Pediu
que o motorista fosse ao banco do carona e dirigiu o carro até um supermercado
para que fosse retirado o dinheiro do caixa. Com medo de que a vítima chamasse
a polícia, deu partida no veículo e dirigiu-se a outra cidade. No meio do
caminho deixou a filha (menor de 12 anos) do proprietário do carro e fugiu. Com
a aproximação muito rápida do veículo, e também pela notícia do roubo já latejando
no rádio, com a descrição do veículo, iniciou-se uma perseguição e o ladrão foi
preso. Aqui confessou o crime, reconhecendo a derrota. Ao menos teve a honra de
assumir o erro, coisa que poucos fazem quando chegam aqui. Além disso, era
foragido do sistema penitenciário, portanto foi feito, além do APF, também o
cumprimento do mandado de prisão (ainda que sem querer).
Sétimo. Para
finalizar o plantão, às 6:51hs, recebemos o 7º flagrante. Um furto com escalada
e remoção de telhas. O bandido subiu pelo telhado com o auxílio de um menor e
no momento em que estavam saindo com a sacola de roupas da loja foram pegos
pela Polícia Militar. O menor, por ter praticado um crime sem violência ou
grave ameaça, foi devolvido a um parente, mas o maior passará ao menos um dia
na cadeia.
Foi bem
cansativo, mas fizemos a diferença nesse dia! Pudemos colocar na prisão aqueles
que não sabem conviver em sociedade, aqueles que precisam ver o sofrimento
alheio para sobreviver, que necessitam criar a desgraça para se alimentarem.
Enfim, cansado, mas satisfeito.
Parabéns,
ResponderExcluirEmbora pelo que leio, sei que não precisas de felicitações...
Mas parabéns. Pela coragem, pela determinação, pela consciência, pela iniciativa e porque não pela inspiração? Rsrsrs
É bom ver que existem pessoas que têm razão e sensibilidade aliadas num cargo que precisa delas, sem se olvidar da rigidez e dos princípios que ela prega.
Fico feliz e esperançosa em saber que existem pessoas como tu. Que tem consciência do poder que tem e da justiça que pode alcançar com ele...
Peço por favor, que não mudes.
Ganhastes uma leitora e uma admiradora desse fantástico trabalho.
Abraços!