quinta-feira, 17 de novembro de 2011

Quarta, 09.11.11 - Um tiro de sorte?

Após o dia de fúria do Policial Militar no plantão anterior, estava preparado para tudo o que pudesse acontecer. Desde um senhor idoso (com 69 anos) que brigou com a filha e esta, com receio de que algo pudesse lhe acontecer de pior, buscou a garrucha do pai e tentou jogá-la para o meio da rua, longe do alcance do velhinho. Na queda, a arma caiu de um jeito que ela acabou disparando e acertando a menina que havia atirado-a. Por sorte os ferimentos foram superficiais, e a munição era composta de vários chumbinhos, pois do contrário uma tragédia poderia ter ocorrido. Isso é que eu chamo de um tiro de sorte. Ou seja, no afã de não ser atingida, acabou por sê-la. A Brigada Militar foi acionada e trouxe a todas as partes até a Delegacia. Aqui houve a prisão em flagrante do senhor por não ter o registro atualizado da arma (mas ele pagou a fiança e foi liberado para responder em liberdade - sem a arma - é claro).

Até mesmo uma família de um famoso criminoso pedindo proteção por estar ameaçada de morte. Alguns dias atrás houve um atentado em frente ao presídio da cidade, e a vítima era um conhecido homicida da cidade, porém, não obtiveram êxito em seu intento. Quando ele voltava de uma saída temporária que lhe foi concedida, foi recebido a balas (de origem desconhecida). Não contentes com o deslinde da situação, mandaram um recado a este que deveria ter morrido: que sua família não descansaria mais em paz, pois os perseguiriam até matar um por um. Com medo, a família foi avisada, e como não tem nada com o submundo do crime, ficaram temerosos que alguma vingança pudesse acontecer realmente. Assim, vieram até a nossa Delegacia para pedir proteção policial (na verdade queriam uma segurança particular - que os acompanhassem onde quer que fossem). Expliquei que era impossível de cumprirmos essa vontade, principalmente pela falta de pessoal que assola praticamente todas as instituições de segurança pública no Brasil. Eles deixaram a DPPA um pouco descontentes, mas conscientes de que era mesmo impossível conceder a proteção que almejavam. (até dia 17.11.11, não tivemos notícia da morte de ninguém da família, o que nos leva a crer que a ameaça não irá se concretizar felizmente).

Após esse pedido um tanto difícil de ser atendido, recebemos uma ocorrência de furto de perfume em uma loja no centro da cidade. Um médico, sem nenhum antecedente, com 46 anos de idade, resolveu se aventurar furtando. Fiquei me perguntando o que ele queria com tal ação. Talvez se vingar do nosso sistema capitalista, talvez porque queria testar sua coragem, ou sem motivo nenhum, o que acredito ser o mais plausível. Quem em sã consciência, com todas as oportunidades em suas mãos, com uma vida estabilizada, se aventura para levar um mero perfume de uma loja? Aqui estava absolutamente cabisbaixo, murcho, parecendo uma criança que tinha feito algo errado. Aparentemente estava arrependido. E não só por isso, mas pelo histórico limpo e também pela pequenez do bem furtado, acabei liberando-o para responder ao processo em liberdade. Onde esse mundo vai parar com um médico fazendo furtos de perfumes.

Ao mesmo tempo um senhor com bafo de cachaça estava sendo escoltado por ter invadido a antiga residência para ameaçar a ex-mulher. Narrou que tinha entrado lá para ver os filhos. Fazia tempo que não os via. Que exemplo de pai terão essas crianças se ele fica dias sem encontrá-las e quando decide por vê-las, vai embriagado? Como não houve violência (e o motivo era a princípio legítimo), ele acabou solto; com uma condição de só ver os filhos quando estes estiverem na creche, sob a supervisão de um responsável.

Pa! Pa! Pa! Pa! Foi a quantidade de tiros que o carro de um traficante levou antes que esse pudesse sair de seu interior e se esconder na mata, fugindo de uma tentativa de homicídio. O dia em que o caçador virou a caça. Ninguém foi preso, tampouco a suposta vítima dos disparos, porque nessa hora o melhor que têm a fazer é se esconder. Resultado: o carro foi apreendido para uma perícia posterior nos projéteis que estiverem em seu interior e possível comparação com outras munições que estajam alojadas nas pessoas que foram assassinadas recentemente.

Ainda recebemos uma família muito nervosa e apreensiva. Segundo narrou a caçula (de 12 anos), ela foi molestada sexualmente por um amigo familiar. Não houve conjunção carnal (penetração), mas as atitudes são equiparadas em hediondez. Beijou-a à força e pediu que agarrasse em seu órgão genital. Os pais quando souberam, por óbvio, ficaram revoltadíssimos e correram aqui para registrar o fato. Ninguém sabia onde estava o estuprador (por sorte dele, porque queriam linchá-lo caso o vissem). Fizemos o possível para o momento - madrugada - e colhemos o depoimento da menina para que ela não precisasse ser ouvida posteriormente sobre fato tão desagradável. A Delegacia da Criança e do Adolescente será a encarregada de continuar as investigações, e tomara que encontrem o acusado, porque a inocência de uma criança, uma vez violada, nunca mais é reestabelecida. Os danos psicológicos são muito duradouros e acompanharão essa menina por toda a vida, muito mais tempo do que sofrerá o estuprador caso seja preso e condenado. Infelizmente a "pena" dessa menina é perpétua.

E para finalizar a noite, recebemos um rapaz narrando que sua ex-namorada, não contente com a separação, foi tentar entrar em sua casa para conversarem. Só que ao invés de tentar pelas vias normais, ela, bêbada, procurou o mais difícil: pular as grades e lanças que gaurneciam o local. Não é preciso ser gêncio para adivinhar o que lhe aconteceu. Ela não conseguiu e fincou os braços nos espetos até que um pedaço de carne saísse de seu corpo. Imediatamente o rapaz foi acordado pelos gritos de dor e chamou a ambulância. Com a ex encaminhada, veio registrar o fato na Delegacia. Nossa diligente policial, foi verificar a procedência da informação, para ver se aquelas eram as lesões causadas. E para nossa surpresa, a moça não estava mais no hospital. Contrariando ordens médicas, fugiu do local sem receber alta, sabe-se quem para onde foi. Naquela noite ninguém mais apareceu por aqui, nem mesmo a fugitiva do hospital.

Ouvimos um barulho de portas sendo mexidas do lado de fora, saímos com atenção redobrada para ver do que se tratava. Eram apenas agentes de outra Delegacia se preparando para uma mega operação que seria iniciada ainda de madrugada. Tive tempo de assinar os autos de cumprimento de mandado de prisão de um assaltante que fora pego bem no início da manhã em decorrência da citada operação da Polícia Civil. Ele era um dos suspeitos de ter participado do assalto que culminou na morte de um policial civil em outra cidade do interior do Estado. Assim, fui para casa vibrante, ciente de ter cumprido o dever de platonista, mas exuberante por ver a Civil trabalhando com tanto afinco no encalço da vagabundagem.

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